Contracepção feminina e política pública no Brasil: pontos e contrapontos da proposta oficial

Alvarenga, Augusta Thereza de; Schor, Néia

doi:10.1590/S0104-12901998000100005

Resumos

O presente trabalho busca retraçar como a questão da contracepção feminina é publicizada na mídia, a partir de matéria veiculada em dois matutinos paulistas e um carioca. Procura demonstrar como interesses econômicos, políticos e ideológicos estão presentes no interior do próprio Estado e da sociedade civil caracterizando, sobretudo na conjuntura 1984-1993, a indefinição de uma política para o setor centrado na polêmica planejamento familiar versus controle da natalidade. A conjuntura pós 93 redefine a discussão enfatizando, com base nos preceitos defendidos na Conferência do Cairo 94 sobre direitos reprodutivos, a questão do direito ao aborto e à esterilização feminina legalizados.

anticoncepção; planejamento familiar; controle de natalidade; saúde da mulher; saúde reprodutiva; aborto; esterilização cirúrgica

The present paper aims at characterising contraception as a public policy in Brazil from news matter published in two São Paulo's and one Rio's major daily newspapers. It tries to show how economic, political and ideological interests are present within the State it self and the civil society focusing the theme in a polemic way in the issue family planning versus birth control. Contraception as a public policy remains thus indefinite specially within 1984-1993. The polar discussion is re-defined after 93 with emphasis on principles defended in the Cairo Conference (1994) on reproductive rights and the right to decriminalized/legalised sterilisation and abortion.

contraception; family planning; birth control; woman health; reproductive health; induced abortion; tubal sterilization

ARTIGOS

Contracepção feminina e política pública no Brasil: pontos e contrapontos da proposta oficial^* * Versão revista e atualizada de palestra proferida no "Simpósio Franco-Brasileiro sobre Prevenção da Mortalidade Materna com Ênfase na Gravidez na Adolescência", São Paulo, 1992 (ALVARENGA, 1992)

Augusta Thereza de Alvarenga^I; Néia Schor^II

^ISocióloga, Professora Doutora do Departamento de Saúde Materno Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. E-mail atal@usp.br

^IIEnfermeira Sanitarista, Professora Associada do Departamento de Materno Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. E-mail nschor@usp.br

RESUMO

O presente trabalho busca retraçar como a questão da contracepção feminina é publicizada na mídia, a partir de matéria veiculada em dois matutinos paulistas e um carioca. Procura demonstrar como interesses econômicos, políticos e ideológicos estão presentes no interior do próprio Estado e da sociedade civil caracterizando, sobretudo na conjuntura 1984-1993, a indefinição de uma política para o setor centrado na polêmica planejamento familiar versus controle da natalidade. A conjuntura pós 93 redefine a discussão enfatizando, com base nos preceitos defendidos na Conferência do Cairo 94 sobre direitos reprodutivos, a questão do direito ao aborto e à esterilização feminina legalizados.

Palavras-chave: anticoncepção; planejamento familiar; controle de natalidade; saúde da mulher; saúde reprodutiva; aborto; esterilização cirúrgica

SUMMARY

The present paper aims at characterising contraception as a public policy in Brazil from news matter published in two São Paulo's and one Rio's major daily newspapers. It tries to show how economic, political and ideological interests are present within the State it self and the civil society focusing the theme in a polemic way in the issue family planning versus birth control. Contraception as a public policy remains thus indefinite specially within 1984-1993. The polar discussion is re-defined after 93 with emphasis on principles defended in the Cairo Conference (1994) on reproductive rights and the right to decriminalized/legalised sterilisation and abortion.

Key words: contraception; family planning; birth control; woman health; reproductive health; induced abortion; tubal sterilization

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

Recebido em: 23/3/98

Aprovado em: 16/6/98

ALVARENGA, A.T. de Política de Planejamento Familiar no Brasil. In: Anais do Simpósio Franco-Brasileiro sobre Prevenção da Mortalidade Materna com Ênfase na Gravidez na Adolescência". São Paulo: Departamento de Saúde Materno-lnfantil da Faculdade de Saúde Pública da USP, 1992. p. 141-50. (Série Investigação em Saúde da Mulher, da Criança e Adolescência, 2).
ARAICA, A.H. De la estadística demográfica a la demografía política: otra transicion. In: WELTI, C. org. Población y desarrollo: una perspectiva latinoamericana después de el Cairo - 94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997. p. 25-64.
ARDAILLON, D. Da ilegalidade tolerada para a tolerância da legalidade. Jornal da redesaúde, 16:3-4,1998.
BARROSO, C. A saúde da mulher no Brasil, 1975-1985. S. Paulo em Perspect., 2(1):25-33,1986.
BERQUÓ, E. Brasil, uma caso exemplar: anticoncepção e partos cirúrgicos. Campinas, Núcleo de Estatística Populacional da UNICAMP, 1993. [Apresentado ao Seminário "A situação da mulher e o desenvolvimento", Campinas, 1993]
BERQUÓ, E. O Brasil e as recomendações do plano de ação do Cairo. In: BILAC, E.D. & ROCHA, M.I.B. da (org) Saúde Reprodutiva na América Latina e no Caribe - Temas e Problemas. Campinas: PROLAP, ABEP, NEPO/UNICAMP/São Paulo: ed. 34,1998, p. 23-35.
BRAGA, J.C. de S & PAULA, S.G. de Saúde e previdência: estudos de política social. São Paulo, CEBES-HUCITEC, 1981.
BRASIL. Congresso Nacional. Relatório n° 1/96 da Comissão Mista relatora do veto presidencial ao PLC 114/94. Brasília: Centro Gráfico do Senado Federal, 1996, Apud ROCHA, M.I.B. da Significados Históricos e Políticos da Regulação da Fecundidade. ln:BATISTA, C. & LARANJEIRA, M. (org). Aborto: desafios da legalidade. Recife, SOS Corpo, 1998. p. 41 -76 (Cadernos SOS Corpo, v. 2)
CANESQUI, A.M. A saúde da mulher em debate. Saúde em Debate, (15/16):29-36,1984.
CANESQUI, A.M. A implantação e expansão dos serviços de planejamento familiar: questões e controvérsias. Rev. Paul. Enf., 5:26-30, 1985.
CARTA aberta por ocasião da visita do Papa ao Brasil. CDD-Católicas pelo direito de decidir. Estudos Feministas, 5(2):418-22,1997.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (5 de outubro de 1988). São Paulo, Editora Atlas, 1998. v. 1, p. 133.
CORRÊA, S.& PETCHESKY, R. Direitos sexuais e reprodutivos: uma perspectiva feminista. Physis: Rev. Saúde Coletiva, 6:147-77,1996.
FIGUEROA PEREA, J.G. Elementos para definir una agenda de docência, investigación y análisis de políticas en el ámbito de la salud reproductiva. In: WELTI, C. org. Problación y desarrollo: una perspectiva latinoamericana después de el Cairo - 94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997. p. 159-201.
FIORI, J.L. & KORNIS, G.E.M. Além da queda: economia e política numa década enviesada. In: GUIMARÃES, R. & TAVARES, R. org. Saúde e sociedade no Brasil anos 80. Rio de Janeiro, Relume Dumará, 1994. p-1-42.
HARDY, E. & REBELLO, I. La discussion sobre el aborto provocado en el Congreso Nacional Brasileño: el papel del movimento de mujeres. Cad. SaúdePúbl., 12(2):259-66,1996.
LOPES, J.R.B. & GOTTSCHALK, A. Recessão, pobreza e família: a década pior do que a perdida. S. Paulo em Perspect., 4(1), 1990.
LUZ, M.T. As instituições médicas no Brasil: instituição e estratégia de Legemonia. Rio de Janeiro, Ed. Graal, 1979.
MELO, J. A polêmica do aborto na imprensa. Estudos Feministas, 5(2):406-12,1997.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Assistência integral à saúde da mulher: bases de ação programática. Brasília, Centro de Documentação do Ministério da Saúde, 1983a.
MINISTÉRIO DA SAÚDE Assistência integral à saúde da mulher; Pronunciamento do Ministro da Saúde, Interino, no encerramento Congresso Brasileiro de Proteção Ma-terno-lnfantil e Planejamento Familiar, 1o, Brasília, 1983, ANAIS. p:3-11,1983b.
ROCHA, M.I.B. da O Parlamento e a questão democrática: um estudo do debate sobre controle da natalidade e planejamento familiar no Congresso Nacional. Campinas, NEPO-UNICAMP, 1987. (textos NEPO, 13).
ROCHA, M.I.B da Política populacional e planejamento familiar. S. Paulo em Perspect., 3(3):20-3,1989.
ROCHA, M.I.B. da A questão do aborto no Brasil: o debate no Congresso. Estudos Feministas, 4(2):381-98,1996.
ROCHA, M.I.B. da Significados históricos e políticos da regulação da fecundidade. In: BATISTA, C. & LARANJEIRA, M. (org). Aborto: desafios da legalidade. Recife, SOS Corpo, 1998, p. 41 -76 (Cadernos SOS Corpo, vol. 2).
WELTI, C. org. Población y desarrollo: uma perspectiva latinoamericana después de el Cairo-94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997.

*

Versão revista e atualizada de palestra proferida no "Simpósio Franco-Brasileiro sobre Prevenção da Mortalidade Materna com Ênfase na Gravidez na Adolescência", São Paulo, 1992 (ALVARENGA, 1992)

Datas de Publicação

Publicação nesta coleção
05 Jun 2008
Data do Fascículo
Jul 1998

Histórico

Aceito
16 Jun 1998
Recebido
23 Mar 1999

This work is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial 4.0 International License.

[1] ALVARENGA, A.T. de Política de Planejamento Familiar no Brasil. In: Anais do Simpósio Franco-Brasileiro sobre Prevenção da Mortalidade Materna com Ênfase na Gravidez na Adolescência". São Paulo: Departamento de Saúde Materno-lnfantil da Faculdade de Saúde Pública da USP, 1992. p. 141-50. (Série Investigação em Saúde da Mulher, da Criança e Adolescência, 2).

[2] ARAICA, A.H. De la estadística demográfica a la demografía política: otra transicion. In: WELTI, C. org. Población y desarrollo: una perspectiva latinoamericana después de el Cairo - 94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997. p. 25-64.

[3] ARDAILLON, D. Da ilegalidade tolerada para a tolerância da legalidade. Jornal da redesaúde, 16:3-4,1998.

[4] BARROSO, C. A saúde da mulher no Brasil, 1975-1985. S. Paulo em Perspect., 2(1):25-33,1986.

[5] BERQUÓ, E. Brasil, uma caso exemplar: anticoncepção e partos cirúrgicos. Campinas, Núcleo de Estatística Populacional da UNICAMP, 1993. [Apresentado ao Seminário "A situação da mulher e o desenvolvimento", Campinas, 1993]

[6] BERQUÓ, E. O Brasil e as recomendações do plano de ação do Cairo. In: BILAC, E.D. & ROCHA, M.I.B. da (org) Saúde Reprodutiva na América Latina e no Caribe - Temas e Problemas. Campinas: PROLAP, ABEP, NEPO/UNICAMP/São Paulo: ed. 34,1998, p. 23-35.

[7] BRAGA, J.C. de S & PAULA, S.G. de Saúde e previdência: estudos de política social. São Paulo, CEBES-HUCITEC, 1981.

[8] BRASIL. Congresso Nacional. Relatório n° 1/96 da Comissão Mista relatora do veto presidencial ao PLC 114/94. Brasília: Centro Gráfico do Senado Federal, 1996, Apud ROCHA, M.I.B. da Significados Históricos e Políticos da Regulação da Fecundidade. ln:BATISTA, C. & LARANJEIRA, M. (org). Aborto: desafios da legalidade. Recife, SOS Corpo, 1998. p. 41 -76 (Cadernos SOS Corpo, v. 2)

[9] CANESQUI, A.M. A saúde da mulher em debate. Saúde em Debate, (15/16):29-36,1984.

[10] CANESQUI, A.M. A implantação e expansão dos serviços de planejamento familiar: questões e controvérsias. Rev. Paul. Enf., 5:26-30, 1985.

[11] CARTA aberta por ocasião da visita do Papa ao Brasil. CDD-Católicas pelo direito de decidir. Estudos Feministas, 5(2):418-22,1997.

[12] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (5 de outubro de 1988). São Paulo, Editora Atlas, 1998. v. 1, p. 133.

[13] CORRÊA, S.& PETCHESKY, R. Direitos sexuais e reprodutivos: uma perspectiva feminista. Physis: Rev. Saúde Coletiva, 6:147-77,1996.

[14] FIGUEROA PEREA, J.G. Elementos para definir una agenda de docência, investigación y análisis de políticas en el ámbito de la salud reproductiva. In: WELTI, C. org. Problación y desarrollo: una perspectiva latinoamericana después de el Cairo - 94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997. p. 159-201.

[15] FIORI, J.L. & KORNIS, G.E.M. Além da queda: economia e política numa década enviesada. In: GUIMARÃES, R. & TAVARES, R. org. Saúde e sociedade no Brasil anos 80. Rio de Janeiro, Relume Dumará, 1994. p-1-42.

[16] HARDY, E. & REBELLO, I. La discussion sobre el aborto provocado en el Congreso Nacional Brasileño: el papel del movimento de mujeres. Cad. SaúdePúbl., 12(2):259-66,1996.

[17] LOPES, J.R.B. & GOTTSCHALK, A. Recessão, pobreza e família: a década pior do que a perdida. S. Paulo em Perspect., 4(1), 1990.

[18] LUZ, M.T. As instituições médicas no Brasil: instituição e estratégia de Legemonia. Rio de Janeiro, Ed. Graal, 1979.

[19] MELO, J. A polêmica do aborto na imprensa. Estudos Feministas, 5(2):406-12,1997.

[20] MINISTÉRIO DA SAÚDE. Assistência integral à saúde da mulher: bases de ação programática. Brasília, Centro de Documentação do Ministério da Saúde, 1983a.

[21] MINISTÉRIO DA SAÚDE Assistência integral à saúde da mulher; Pronunciamento do Ministro da Saúde, Interino, no encerramento Congresso Brasileiro de Proteção Ma-terno-lnfantil e Planejamento Familiar, 1o, Brasília, 1983, ANAIS. p:3-11,1983b.

[22] ROCHA, M.I.B. da O Parlamento e a questão democrática: um estudo do debate sobre controle da natalidade e planejamento familiar no Congresso Nacional. Campinas, NEPO-UNICAMP, 1987. (textos NEPO, 13).

[23] ROCHA, M.I.B da Política populacional e planejamento familiar. S. Paulo em Perspect., 3(3):20-3,1989.

[24] ROCHA, M.I.B. da A questão do aborto no Brasil: o debate no Congresso. Estudos Feministas, 4(2):381-98,1996.

[25] ROCHA, M.I.B. da Significados históricos e políticos da regulação da fecundidade. In: BATISTA, C. & LARANJEIRA, M. (org). Aborto: desafios da legalidade. Recife, SOS Corpo, 1998, p. 41 -76 (Cadernos SOS Corpo, vol. 2).

[26] WELTI, C. org. Población y desarrollo: uma perspectiva latinoamericana después de el Cairo-94. Mexico, PROLAP/UNAM, 1997.