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Avaliação da Vergonha em Adolescentes: ‘The Other as Shamer Scale

Assessment of Shame in Adolescents: The ‘Other as Shamer’ Scale

RESUMO

A vergonha, entendida como uma emoção autoconsciente, multifacetada e socialmente focada, desempenha um papel central na saúde mental dos indivíduos. Nos adolescentes, é também uma experiência frequente, sendo importante a sua avaliação para a investigação e prática clinica. Este estudo pretende validar uma medida breve de vergonha externa (Escala de Vergonha Externa - Versão breve para Adolescentes [OASB-A]). Participaram 834 adolescentes com uma média de 15 anos. O modelo final da OASB-A (8 itens), obtido por meio da Análise Fatorial Confirmatória, apresenta um bom ajustamento aos dados, invariância para o sexo, boa consistência interna e fidedignidade temporal adequada. As correlações com as experiências traumáticas de vergonha (IES-R) e sintomatologia psicopatológica (DASS-21) são significativas. A OASB-A é uma medida válida e econômica para avaliação da vergonha externa em adolescentes.

Palavras-chave:
adolescência; avaliação; Escala de Vergonha Externa; psicometria; vergonha externa

ABSTRACT

Shame, as a self-conscious, multidimensional and socially focused emotion, plays a central role in the mental health of individuals. In adolescents, shame is also a frequent experience and its assessment is important for research and clinical practice. This study aims to validate a brief measure of external shame (Other as Shamer Scale - brief version for adolescents [OASB-A]). The participants were 834 adolescents with a mean age of 15 years. The final model of the OASB-A (8 items), obtained through CFA, presents a good fit to the data. The OASB-A shows a good internal consistency and an adequate temporal reliability. The OASB-A also reveals significant correlations with traumatic shame experiences (IES-R) and psychopathological symptoms (DASS-21). The OASB-A is an economic and reliable measure to assess external shame in adolescents.

Keywords:
adolescence; assessment; Other as Shamer Scale; psychometrics; external shame

Recentemente tem-se assistido a um crescente interesse, no domínio da investigação e da clínica, pelo conceito de vergonha e o seu impacto na saúde mental, quer em adultos (Gilbert, 2002Gilbert, P. (2002). Body shame: A biopsychosocial conceptualisation and overview, with treatment implications. In P. Gilbert & J. Miles (Eds.), Body Shame: Conceptualisation, research and treatment (pp. 3-54). London: Routledge.; Gilbert & Irons, 2005Gilbert, P., & Irons, C., (2005). Focused therapies and compassionate mind training for shame and self attacking. In P. Gilbert (Ed.), Compassion: Conceptualisations, research and use in psychotherapy (pp. 263-325). London: Routledge.; Matos, 2012Matos, M. (2012). Shame memories that shape who we are. Unpublished Doctoral Dissertation. University of Coimbra, Portugal.; Matos & Pinto-Gouveia, 2010Matos, M., & Pinto-Gouveia, J. (2010). Shame as a traumatic memory. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(4), 299-312. doi: 10.1002/cpp.659
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; Pinto-Gouveia & Matos, 2011Pinto-Gouveia, J., & Matos, M. (2011). Can shame memories become a key to identity? The centrality of shame memories predicts psychopathology. Applied Cognitive Psychology, 25, 281-290. doi: 10.1002/acp1689.
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), quer em adolescentes (Aslund, Nilsson, Starrin, & Sjöberg, 2007Aslund, C., Nilsson, K.W., Starrin, B., & Sjöberg, R.L. (2007). Shaming experiences and the association between adolescent depression and psychosocial risk factors. European Child & Adolescent Psychiatry, 16(5), 298-304. http://dx.doi.org/10.1007/s00787-006-0564-1
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; Cunha, Matos, Faria, & Zagalo, 2012Cunha, M., Matos, M., Faria, D., & Zagalo, S. (2012). Shame Memories and Psychopathology in Adolescence: The Mediator Effect of Shame. International Journal of Psychology & Psychological Therapy, 12(2), 203-218.; De Rubeis & Hollenstein, 2009De Rubeis, S. & Hollenstein, T. (2009). Individual differences in shame and depressive symptoms during early adolescence. Personality and Individual Differences, 46, 477-482. doi:10.1016/j.paid.2008.11.019
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).

A vergonha é uma emoção autoconsciente, multifacetada e socialmente focada. Essa emoção está ligada a ameaças à identidade (social) do self (Tracy, Robins, & Tangney, 2007Tracy, J. L., Robins, R. W., & Tangney, J. P. (Eds.) (2007). The self-conscious emotions: Theory and research. New York, NY: Guilford.). Não obstante a existência de diferentes perspetivas teóricas, é unânime a vergonha ser considerada uma vivência interna do eu como indesejável, defeituoso, não atrativo, sem valor ou impotente (Gilbert, 1998Gilbert, P. (1998). What is shame? Some core issues and controversies. In P. Gilbert & B. Andrews (Eds.), Shame: Interpersonal behaviour, psychopathology and culture (pp. 3-36). New York: Oxford University Press.; Lewis, 1992Lewis, M. (1992). Shame: The exposed self. New York: The Free Press.; Matos, 2012Matos, M. (2012). Shame memories that shape who we are. Unpublished Doctoral Dissertation. University of Coimbra, Portugal.; Tangney & Fisher, 1995Tangney, J. & Fischer, K. (Eds.) (1995). Self-conscious emotions: The psychology of shame, guilt, embarrassment, and pride. New York: Guilford Press.).

Segundo diversos autores (Gilbert & Andrews, 1998Gilbert, P. & Andrews, B. (Eds.) (1998). Shame: Interpersonal behavior, psychopathology and culture. New York: Oxford.; Lewis, 1992Lewis, M. (1992). Shame: The exposed self. New York: The Free Press.), a vergonha é desenvolvida precocemente a partir das nossas interações com pessoas significativas. Essas experiências precoces vão influenciar de forma contínua e acentuada o nosso comportamento posterior em contextos sociais, quer a nível individual, interpessoal, grupal ou cultural.

A experiência complexa e multifacetada desta emoção tem sido conceptualizada com base no modelo biopsicossocial, incluindo fatores biológicos (e.g., temperamento, genética), fatores individuais (e.g., experiências pessoais e de vinculação, relações familiares e com o grupo de pares) e o contexto sociocultural (e.g., valores sociais de sucesso, atratividade e aceitação/valorização social) (Gilbert, 1998Gilbert, P. (1998). What is shame? Some core issues and controversies. In P. Gilbert & B. Andrews (Eds.), Shame: Interpersonal behaviour, psychopathology and culture (pp. 3-36). New York: Oxford University Press., 2002Gilbert, P. (2002). Body shame: A biopsychosocial conceptualisation and overview, with treatment implications. In P. Gilbert & J. Miles (Eds.), Body Shame: Conceptualisation, research and treatment (pp. 3-54). London: Routledge.). A interação reciproca desses fatores influencia a forma como acreditamos ser vistos aos olhos dos outros e como fazemos predições acerca do que os outros pensam e sentem em relação a nós. Por exemplo, os indivíduos sujeitos a experiências precoces de negligência, criticismo, abuso, bullying, ausência de afeto e segurança podem tornar-se muito sensíveis a ameaças de rejeição ou criticismo do mundo externo. Assim, esta ameaça real ou percebida como agente social indesejado, desvalorizado e/ou rejeitado (e.g., vergonha) pode dar origem a várias emoções negativas (e.g., ansiedade, raiva, nojo) e comportamentos defensivos (por exemplo, evitamento, submissão/subordinação, contra-ataque). Este ciclo vicioso acarreta implicações negativas para a auto-identidade, para o bem-estar psicológico e emocional (Gilbert, 1998Gilbert, P. (1998). What is shame? Some core issues and controversies. In P. Gilbert & B. Andrews (Eds.), Shame: Interpersonal behaviour, psychopathology and culture (pp. 3-36). New York: Oxford University Press., 2002Gilbert, P. (2002). Body shame: A biopsychosocial conceptualisation and overview, with treatment implications. In P. Gilbert & J. Miles (Eds.), Body Shame: Conceptualisation, research and treatment (pp. 3-54). London: Routledge.). De fato, investigações empíricas e sistemáticas têm revelado que a vergonha se encontra associada a outras emoções (e.g., culpa, orgulho, raiva, medo) (Tangney, Miller, Flicker, & Barlow, 1996Tangney, J. P., Miller, R. S., Flicker, L., & Barlow, D. (1996). Are shame, guilt, and embarrassment distinct emotions? Journal of Personality and Social Psychology, 70, 1256-1269. doi:10.1037/0022-3514.70.6.1256
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; Tangney Stuewig, & Mashek, 2007Tangney, J., Stuewig, J., & Mashek, D. (2007). Moral emotions and moral behaviour. Annual Review of Psychology, 58, 345-372. doi:10.1146/annurev.psych.56.091103.070145.
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), bem como a diversa sintomatologia e psicopatologia (e.g., ansiedade, depressão, paranóia, comportamentos alimentares) (Cheung, Gilbert, & Irons, 2004Cheung, M., Gilbert, P., & Irons, C. (2004). An exploration of shame, social rank and rumination in relation to depression. Personality and Individual Differences, 36(5), 1143-1153. http://dx.doi.org/10.1016/S0191-8869(03)00206-X
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; Matos & Pinto-Gouveia, 2010Matos, M., & Pinto-Gouveia, J. (2010). Shame as a traumatic memory. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(4), 299-312. doi: 10.1002/cpp.659
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; Tangney & Dearing, 2002Tangney, J. P., & Dearing, R. L. (2002). Shame and guilt. New York: The Guilford Press.; Matos, Pinto-Gouveia, & Gilbert, 2013Matos, M., Pinto-Gouveia, J., & Gilbert, P. (2013). The effect of shame and shame memories on paranoid ideation and social anxiety. Clinical Psychology & Psychotherapy, 20(4), 334-349. doi: 10.1002/cpp.1766
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; Troop, Allan, Serpell, & Treasure, 2008Troop, N. A., Allan, S., Serpell, L., & Treasure, J. L. (2008). Shame in women with a history of eating disorders. European Eating Disorders Review, 16, 480-488. DOI: 10.1002/erv.858
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).

À luz do modelo evolucionário, Gilbert (1998Gilbert, P. (1998). What is shame? Some core issues and controversies. In P. Gilbert & B. Andrews (Eds.), Shame: Interpersonal behaviour, psychopathology and culture (pp. 3-36). New York: Oxford University Press., 2003Gilbert, P. (2003). Evolution, social roles and the differences in shame and guilt. Social Research, 70, 1205-1230., 2007)Gilbert, P. (2007). The evolution of shame as a marker for relationship security. In J.L. Tracy, R.W. Robins & J.P. Tangney (Eds.), The self-conscious emotions: Theory and research (pp. 283-309). New York: Guilford Press. defende que podem ser distinguidas duas dimensões da vergonha, a vergonha interna e a vergonha externa, diferindo estas duas dimensões quanto ao foco da atenção, pensamentos e comportamentos associados. A vergonha interna diz respeito a cognições e afetos que o sujeito tem acerca das suas características, atributos ou comportamentos, frequentemente associados ao elevado autocriticismo, e que resultam numa visão negativa de si mesmo (Kaufman, 1992.Kaufman, G. (1992). Shame: The power of caring (rev. ed.). Rochester, VT: Schenkman Books.). Quando o sujeito integra esta visão menos positiva de si passa a autoavaliar-se de forma negativa e constrói a sua identidade à volta destes sentimentos de inadequação e rejeição (Gilbert, 2002Gilbert, P. (2002). Body shame: A biopsychosocial conceptualisation and overview, with treatment implications. In P. Gilbert & J. Miles (Eds.), Body Shame: Conceptualisation, research and treatment (pp. 3-54). London: Routledge.). O indivíduo com uma elevada vergonha interna sente-se inferior e inadequado, quando se compara aos outros, ainda que estes demostrem aceitação e afeto positivo em relação a si.

Por sua vez, a vergonha externa refere-se ao que o sujeito julga que os outros pensam acerca de si. Assim, o sujeito teme que os outros o percebam como inferior, defeituoso ou incompetente e que isso possa resultar em rejeição, ataque ou perda da atratividade aos olhos dos outros (Gilbert, 2000Gilbert, P. (2000). The relationship of shame, social anxiety and depression: The role of the evaluation of social rank. Clinical Psychology and Psychotherapy, 7(3), 174-189. http://dx.doi.org/10.1002/1099-0879(200007)7:3%3C174::AID-CPP236%3E3.0.CO;2-U
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). Neste caso, os sujeitos podem não se sentir desajustados ou defeituosos - vergonha interna, mas o medo de serem rejeitados - vergonha externa - pode ser tão intenso que leva ao uso de comportamentos defensivos (Thompson & Kent, 2001Thompson, A. R., & Kent, G. (2001). Adjusting to disfigurement: Processes involved in dealing with being visibly different. Clinical Psychology Review, 21(5): 663-682. Doi: 10.1016/S0272-7358(00)00056-8.
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). Neste tipo de vergonha, o foco de atenção está no mundo social externo e dirige-se para a mente do outro. Apesar de se aceitar a diferenciação destas duas tipologias, é inevitável a existência de uma correlação entre as cognições presentes na vergonha interna e na vergonha externa, já que ambas se reportam a atributos negativos do self e se alimentam ou se potenciam mutuamente (Goss, Gilbert, & Allan, 1994Goss, K., Gilbert, P. & Allan, S. (1994). An exploration of shame measures - I: Other as Shamer Scale. Personality and Individual Differences, 5, 713-717. Doi: 10.1016/0191-8869(94)90149-X
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).

Para a avaliação da emoção de vergonha existem alguns instrumentos de autorresposta que têm evidenciado bons resultados na investigação. Entre eles, podemos apontar o Test of Self-Conscious Affect for Adolescents (TOSCA-A; Tangney & Dearing, 2002Tangney, J. P., & Dearing, R. L. (2002). Shame and guilt. New York: The Guilford Press.), que avalia os níveis de vergonha e culpa por meio de 15 cenários que envolvem transgressões morais ou sociais. Outra escala de autorrelato utilizada para avaliar a vergonha é a Experience of Shame Scale (ESS; Andrews, Qian, & Valentine, 2002Andrews, B., Qian, M., & Valentine, J. (2002). Predicting depressive symptoms with a new measure of shame: The Experience of Shame Scale. British Journal of Clinical Psychology, 41(1), 29-42. http://dx.doi.org/10.1348/014466502163778
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), composta por 25 itens que avaliam diferentes componentes da vergonha: a vergonha caracterológica, comportamental e corporal. De referir ainda a Internalized Shame Scale (ISS; Cook, 1987Cook, D. R. (1987). Measuring shame: The internalized shame scale. Alcoholism Treatment Quarterly, 4, 197-215. http://dx.doi.org/10.1300/J020v04n02_12
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, 1994Cook, D. R. (1994, 2001). Internalized shame scale: Technical manual. North Tonawanda, NY: Multi-Health Systems, Inc., 1996Cook, D. R. (1996). Empirical studies of shame and guilt: The Internalized Shame Scale. In D. L. Nathanson (Ed.), Knowing feeling: Affect, script and psychotherapy (pp. 132-165). New York: W. W. Norton & Company., 2001Cook, D. R. (1994, 2001). Internalized shame scale: Technical manual. North Tonawanda, NY: Multi-Health Systems, Inc.) formada por duas subescalas: vergonha interna (24 itens), que avalia a experiência de vergonha enquanto traço; e a subescala de autoestima, composta por 6 itens positivamente formulados.

Em particular, na investigação sobre a vergonha externa, o instrumento de autorresposta mais utilizado é o Other as Shamer (OAS), formado por 18 itens e desenvolvido por Goss, Gilbert, e Allan (1994)Goss, K., Gilbert, P. & Allan, S. (1994). An exploration of shame measures - I: Other as Shamer Scale. Personality and Individual Differences, 5, 713-717. Doi: 10.1016/0191-8869(94)90149-X
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. Partindo dos itens da escala de vergonha interna (Internalized Shame Scale - ISS; Cook, 1996Cook, D. R. (1996). Empirical studies of shame and guilt: The Internalized Shame Scale. In D. L. Nathanson (Ed.), Knowing feeling: Affect, script and psychotherapy (pp. 132-165). New York: W. W. Norton & Company.), orientado especialmente para a avaliação das experiências internas do eu ou das respostas do indivíduo às situações indutoras de vergonha, estes autores eliminaram seis itens que avaliavam a autoestima e modificaram os restantes 18 de forma a incluir as expectativas de como os outros vêm ou julgam o eu. Por exemplo, o item da ISS Sinto que não sou suficientemente bom (boa) foi alterado para Sinto que as outras pessoas não me veem como sendo suficientemente bom (boa). Assim, a versão final da OAS procura avaliar os julgamentos globais acerca de como os sujeitos pensam que os outros os veem (o mesmo é dizer, vergonha externa), por meio de uma escala de resposta de cinco pontos. Valores mais altos na pontuação desta escala indicam maiores níveis de vergonha externa.

A OAS tem mostrado boas propriedades psicométricas em populações de adultos (Allan, Gilbert, & Goss, 1994Allan, S., Gilbert, P., & Goss, K. (1994). An exploration of shame measures - II: Psychopathology. Personality and Individual Differences, 17(5), 719-722. http://dx.doi.org/10.1016/0191-8869(94)90150-3
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; Goss et al., 1994Goss, K., Gilbert, P. & Allan, S. (1994). An exploration of shame measures - I: Other as Shamer Scale. Personality and Individual Differences, 5, 713-717. Doi: 10.1016/0191-8869(94)90149-X
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). A versão original é constituída por três fatores, Inferioridade (e.g., Sinto que as outras pessoas não me veem como sendo suficientemente bom(boa)), Reação dos outros aos meus erros (e.g., As outras pessoas ‘deitam-me’ muitas vezes abaixo.) e Vazio (e.g., Os outros veem-me como sendo vazio(a) e insatisfeito(a)). Contudo, no estudo da dimensionalidade (Goss et al., 1994Goss, K., Gilbert, P. & Allan, S. (1994). An exploration of shame measures - I: Other as Shamer Scale. Personality and Individual Differences, 5, 713-717. Doi: 10.1016/0191-8869(94)90149-X
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), alguns itens apresentaram saturações fatoriais em mais do que um fator ou não saturaram significativamente em nenhuma dos fatores, o que tem justificado a utilização do total deste instrumento como uma medida global de vergonha externa com elevada consistência interna (α = 0,92).

A versão portuguesa desta escala, numa amostra da comunidade (N = 811), revelou uma estrutura unidimensional que explica 39.8% da variância, uma excelente consistência interna (alfa de Cronbach = .91) e uma excelente estabilidade temporal (r = .70) (Matos, Pinto-Gouveia, & Duarte, 2011Pinto-Gouveia, J., & Matos, M. (2011). Can shame memories become a key to identity? The centrality of shame memories predicts psychopathology. Applied Cognitive Psychology, 25, 281-290. doi: 10.1002/acp1689.
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). A OAS revelou igualmente uma correlação moderada com uma medida de vergonha (Experience of Shame Scale; Andrews et al., 2002Andrews, B., Qian, M., & Valentine, J. (2002). Predicting depressive symptoms with a new measure of shame: The Experience of Shame Scale. British Journal of Clinical Psychology, 41(1), 29-42. http://dx.doi.org/10.1348/014466502163778
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), o que atesta a sua validade convergente. Evidenciou ainda correlações baixas e moderadas com as subescalas de Depressão, Ansiedade e Stress (Lovibond & Lovibond, 1995Lovibond, P. & Lovibond, H. (1995). The structure of negative emotional states: Comparison of the Depression Anxiety Stress Scales (DASS) with Beck Depressive and Anxiety Inventories. Behaviour Research and Therapy, 33(3), 335-343. http://dx.doi.org/10.1016/0005-7967(94)00075-U
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), sendo capaz de discriminar entre sujeitos com índices elevados e baixos de sintomatologia psicopatológica (Matos et al., 2011Matos, M., Pinto-Gouveia, J., & Duarte, C. (2011). Other as Shamer: Versão portuguesa e propriedades psicométricas de uma medida de vergonha externa. Manuscript submitted for publication.).

Recentemente, dada a grande utilização dessa escala na investigação da emoção de vergonha e considerando as vantagens de um instrumento reduzido de avaliação, foi desenvolvida uma nova versão. Esta é composta por oito itens e designada por versão breve (OAS2; Matos, Pinto-Gouveia, Gilbert, Duarte, & Figueiredo, 2015Matos, M., Pinto-Gouveia, J., Gilbert, P., Duarte, C., & Figueiredo, C. (2015). The Other As Shamer Scale-2: Development and validation of a short version of a measure of external shame. Personality and Individual Differences, 74, 6-11. doi:10.1016/j.paid.2014.09.037
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). A eliminação dos itens resultou da sua classificação por parte de experts neste tópico. Assim, foi pedido a um conjunto de clínicos que indicasse por ordem decrescente os 10 itens mais representativos do constructo de vergonha externa. Posteriormente, foi conduzida uma Análise Fatorial Confirmatória da OAS2, formada por oito itens, na qual foi confirmada a estrutura unidimensional, apresentando um bom ajustamento. Os resultados revelaram igualmente uma boa validade concorrente e divergente (Matos et al., 2015Matos, M., Pinto-Gouveia, J., Gilbert, P., Duarte, C., & Figueiredo, C. (2015). The Other As Shamer Scale-2: Development and validation of a short version of a measure of external shame. Personality and Individual Differences, 74, 6-11. doi:10.1016/j.paid.2014.09.037
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).

Não obstante o crescente interesse por este tópico e o consequente desenvolvimento de investigação, esta tem incidido essencialmente em amostras de adultos, sendo ainda escassa a informação no que diz respeito à adolescência. Na adolescência, existe um aumento de preocupações relativamente às avaliações de si e dos outros, bem como à competição pela aceitação, aprovação e status (Wolfe, Lennox, & Cutler, 1986Wolfe, R.N., Lennox, R.D., & Cutler, B.L. (1986). Getting along and getting ahead: empirical support for a theory of protective and acquisitive self-presentation. Journal of Personality and Social Psychology, 50(2), 356-361. http://dx.doi.org/10.1037/0022-3514.50.2.356
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), o que pode tornar os jovens mais vulneráveis às dificuldades de auto-apresentação, ao medo da rejeição ou da atribuição de um lugar social indesejado ou inferior; vivências essas associadas à experiência de vergonha (Gilbert & Irons, 2009Gilbert, P., & Irons, C. (2009). Shame, self-criticism and self-compassion in adolescence. In N.B. Allen & L.B. Sheeber (Eds.), Adolescent emotional development and the emergence of depressive disorders (pp. 195-214). Cambridge: Cambridge University Press. http://dx.doi.org/10.1017/CBO9780511551963
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). Neste sentido, assume-se de especial importância a avaliação deste tipo de experiências e das suas potenciais características traumáticas nesta etapa da vida.

Com o objetivo de ampliar a investigação a adolescentes, a escala de vergonha externa de 18 itens (OAS) foi adaptada e utilizada em jovens dos 12 aos 18 anos de idade, tendo-se verificado igualmente nesta população uma estrutura unidimensional, semelhante aos resultados obtidos com adultos e uma boa fidedignidade (alfa de Cronbach = ,95) (Cunha et al., 2012Cunha, M., Matos, M., Faria, D., & Zagalo, S. (2012). Shame Memories and Psychopathology in Adolescence: The Mediator Effect of Shame. International Journal of Psychology & Psychological Therapy, 12(2), 203-218.). Outro estudo (Figueira, 2010Figueira, S. (2010). A vivência de vergonha nos adolescentes: Estudo da Vergonha Externa e a sua relação com a Comparação Social e o Auto-Criticismo. Unpublished Master’s Thesis. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Coimbra.), realizado numa amostra de 358 adolescentes, verificou por meio da Análise Fatorial Exploratória a existência da estrutura de três fatores a explicar 61% da variância total. Todos os fatores (Inferioridade, Reação dos outros aos meus erros e Vazio) apresentaram uma boa consistência interna, bem como o total da escala (alfa de Cronbach = ,94).

Uma vez que a versão reduzida (OAS2) se mostrou uma medida econômica, válida e fidedigna para avaliar a vergonha externa em adultos, estávamos interessados em perceber como se comporta esta versão aplicada a uma população de adolescentes. Neste sentido, o presente estudo tem como objetivo fundamental confirmar a estrutura unifatorial e analisar as características psicométricas da Escala de Vergonha Externa para Adolescentes - versão breve (OASB-A).

Método

Participantes

A amostra é constituída por 834 adolescentes, 376 rapazes e 458 meninas, com idades compreendidas entre os 12 e os 18 anos de idade (M = 15,42; DP = 1,77), que frequentam escolas públicas de várias localidades da região central de Portugal, do 7º ao 12º ano de escolaridade (M = 9,54; DP = 1,63). Não se verificaram diferenças significativas entre garotos e garotas no que respeita à idade, t(832) = -1,71; p = 0,089. Em relação à escolaridade, as moças (M = 9.,0; DP = 1,61) apresentaram uma média significativamente, t(832) = -3,09; p =.002, mais elevada que os rapazes (M = 9,35; DP = 1,63).

Para a análise da validade convergente e discriminante, foi utilizada uma subamostra dos 834 sujeitos, constituída por 367 adolescentes, 168 rapazes (45,8%) e 199 moças (54,2%). Apresentaram uma idade média de 15 anos (M = 14,98; DP = 1,78) e uma média de 9 anos de escolaridade (M = 9,24; DP = 1,61). Garotas e garotos não diferiram significativamente no que respeita à média de idade, t(365) = 0,228, p =0,820. Já em relação à escolaridade, verificou-se uma diferença significativa, t(365) = 2,643; p =0,009; as meninas apresentarem mais anos de escolaridade (M = 9,44; DP = 1,57) do que os rapazes (M= 9,00; DP = 1,63).

Por último, para o estudo da estabilidade temporal foi utilizada uma amostra de 56 adolescentes. Dos quais, 29 eram meninas e 27, rapazes.

Instrumentos

O protocolo de avaliação foi constituído por uma ficha de dados sociodemográficos, pela OASB-A e por dois questionários de autorresposta utlizados para o estudo da sua validade.

Escala de Vergonha Externa- Versão breve para Adolescentes (Other as Shamer Scale -OAS; Goss, Gilbert, & Allan, 1994Goss, K., Gilbert, P. & Allan, S. (1994). An exploration of shame measures - I: Other as Shamer Scale. Personality and Individual Differences, 5, 713-717. Doi: 10.1016/0191-8869(94)90149-X
https://doi.org/10.1016/0191-8869(94)901...
; versão portuguesa para adolescentes: Pinto-Gouveia, Cunha, Matos, & Gilbert, 2013Pinto-Gouveia, J., Cunha, M., Matos, M., & Gilbert, P. (2013). Escala da Vergonha Externa - versão breve para Adolescentes (Other as Shamer brief version - OASB for Adolescents). Unpublished manuscript. Coimbra, CINEICC, FPCE da Universidade de Coimbra.)
. É composta por oito itens que avaliam a vergonha externa, i.e., aquilo que os sujeitos pensam acerca da forma como os outros os veem. Os respondentes avaliam a frequência das experiências ou sentimentos, de acordo com uma escala de 5 pontos (0 = nunca; 1 = raramente; 2 = às vezes; 3 = frequentemente; 4 = quase sempre). Pontuações globais mais altas indicam níveis mais elevados de vergonha externa. Esta escala constitui o alvo principal do presente estudo, pelo que apresentaremos os resultados das suas qualidades psicométricas mais à frente.

Escala do Impacto do Acontecimento-Revista (Impact of Event Scale-Revised - IES-R; Weiss & Marmar, 1997Weiss, D.S., & Marmar, C.R. (1997). The impact of event scale-Revised. In J.P. Wilson, & T.M. Keane (Eds.), Assessing psychological trauma and PTSD (pp. 399-411). New York: Guilford Press.; versão portuguesa para adolescentes de Cunha, Matos, & Pinto Gouveia, 2011Cunha, M., Matos, M., & Pinto-Gouveia, J. (2011). Escala do Impacto do Acontecimento- Revisto para Adolescentes (Impact of Event Scale-Revised - IES-R for Adolescents). Unpublished manuscript. Coimbra, CINEICC, FPCE da Universidade de Coimbra.). Avalia o sofrimento subjetivo que advem de uma experiência específica. Neste estudo, as instruções foram adaptadas para os adolescentes responderem aos itens do questionário com base numa experiência marcante de vergonha que tivessem vivenciado durante a sua infância ou adolescência. O IES-R foi um dos instrumentos escolhidos para avaliar a validade convergente da OASB-A, já que, conceptualmente, se espera que a percepção da experiência atual de vergonha esteja associada à percepção do seu impacto. Esta escala contém 22 itens, que são respondidos através de uma escala de 5 pontos (0 = Nada; 4 = Muitíssimo). Na sua estrutura original, a IES-R é composta por três subescalas (intrusão, evitamento e hiperativação) que medem as três características primordiais da sintomatologia traumática associada a uma determinada experiência. A versão portuguesa para adolescentes (IES-R-A) apresenta uma estrutura unidimensional, explicando 45% da variância total, uma excelente consistência interna (α = 0,94) e uma estabilidade temporal adequada (Cunha, Xavier, Matos, & Zagalo, 2013Cunha, M., Xavier, A., Matos, M., & Zagalo, S. (2013). The traumatic impact of shame experiences: Study of the psychometric properties of the Impact Event Scale in adolescents (IES-A). Atencíon Primária, 45 (especial congresso 1), 132-188.).

No presente estudo a escala revelou boas qualidades psicométricas, evidenciando uma elevada consistência interna (α = 0,94).

Escalas de Depressão, Ansiedade e Stress (Depression, Anxiety and Stress Scales- DASS-21; Lovibond, & Lovibond, 1995Lovibond, P. & Lovibond, H. (1995). The structure of negative emotional states: Comparison of the Depression Anxiety Stress Scales (DASS) with Beck Depressive and Anxiety Inventories. Behaviour Research and Therapy, 33(3), 335-343. http://dx.doi.org/10.1016/0005-7967(94)00075-U
http://dx.doi.org/10.1016/0005-7967(94)0...
; versão portuguesa para crianças de Leal, Antunes, Passos, Pais-Ribeiro, & Marôco, 2009Leal, I., Antunes, R., Passos, T., Pais-Ribeiro, J. L., & Marôco, J. (2009). Estudo da Escala de depressão, ansiedade e estresse para crianças (EADS- C). Psicologia, Saúde e Doenças, 10(2), 277-284.).
São compostas por 21 itens que avaliam três dimensões de sintomas psicopatológicos: depressão, ansiedade e estresse. Este instrumento foi escolhido para avaliar a validade convergente da OASB-A porque a investigação demonstra que a perceção de vivência de vergonha está associada aos sintomas psicopatológicos, nomeadamente depressivos e ansiosos. Na presente amostra, evidenciaram boas propriedades psicométricas, com valores de alfa de Cronbach de 0,87, 0,86 e 0,88 para as subescalas de depressão, ansiedade e estresse, respectivamente.

Procedimentos

Previamente à coleta de dados, foi obtida, primeiro, a aprovação da Direção-Geral da Educação (DGE) do Ministério da Educação e Ciência (MEC) de Portugal para a realização de um projeto de investigação mais alargado com adolescentes que frequentam o ensino regular. Segundo, foi obtida a autorização para a realização do estudo junto dos diretores de cada escola, bem como o consentimento informado de todos os participantes e respectivos encarregados de educação. Os questionários foram administrados em grupo, em contexto de sala de aula. Antes de cada administração, os alunos foram informados acerca da natureza do estudo, bem como foram respondidas todas as questões ou dúvidas expostas. Para além do consentimento informado, foi também assegurado o caráter voluntário da participação, o anonimato e a confidencialidade dos dados, assim como a liberdade de desistência a qualquer momento. Três semanas após a primeira administração, um grupo de 56 adolescentes preencheu novamente a OASB-A com o objetivo de avaliar a estabilidade temporal deste instrumento.

Resultados

Análise Estatística dos Dados

No tratamento estatístico dos dados utilizamos o PASW Statistics versão 18.0 (IBM SPSS Statistics) e o Amos (v.18, SPSS Inc. IBM).

Testamos um modelo de Análise Fatorial Confirmatória da estrutura unidimensional da Escala de Vergonha Externa para Adolescentes - versão breve (OASB-A) com recurso ao software Amos. Para o estudo da qualidade dos itens e análise da consistência interna, utilizamos as estatísticas descritivas para cada item e realizamos a correlação item-total que mostra as correlações entre cada item e a pontuação total da escala. De acordo com as recomendações de vários autores (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.; Howell, 2008Howell, D.C. (2008). Fundamental statistics for the behavioral sciences (6th ed.). Belmont, CA: Thomson/Wadsworth.), consideramos aceitáveis correlações item-total acima de 0,3. Também foi analisada a consistência interna através do alfa de Cronbach, cujo valor é considerado bom acima de 0,7 (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.).

Também realizamos correlações de Pearson (Tabachnick & Fidell, 2007Tabachnick, B. G., & Fidell, L. S. (2007). Using multivariate statistics (5th Edition.). Boston, MA: Allyn and Bacon.) para avaliar a estabilidade temporal da escala, a influência das variáveis idade e escolaridade, assim como a validade convergente da OASB-A com outras medidas de sintomatologia traumática de ansiedade, depressão e estresse. Usamos ainda testes t-Student para amostras independentes e emparelhadas (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.; Howell, 2008Howell, D.C. (2008). Fundamental statistics for the behavioral sciences (6th ed.). Belmont, CA: Thomson/Wadsworth.) para comparar as pontuações médias de vergonha externa entre meninos e meninas, bem como entre o teste e o reteste, respectivamente.

Análise Preliminar dos Dados

Foram analisados os pressupostos de normalidade multivariada. A normalidade das variáveis foi analisada por meio do Teste de Kolmogorov-Smirnov, e o enviesamento em relação à média por meio dos coeficientes de assimetria e curtose (Skewness e Kurtosis, respetivamente). O resultado do teste de Kolmogorov-Smirnov revelou-se significativo (p < 0,05). No entanto, este teste tende a ser significativo em amostras amplas (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.). A análise dos coeficientes de assimetria e curtose mostrou que nenhuma variável apresentou violações severas à distribuição normal (Sk<3 and Ku<8-10) (Kline, 2005Kline, R. (2005). Principles and practice of structural equation modelling (2th ed.). New York: The Guilford Press.). A existência de outliers foi avaliada pela distância quadrada de Mahalanobis (D2), que indicou a presença de alguns valores extremos, mas optou-se pela manutenção dos mesmos para não diminuir a variabilidade associada ao fator em estudo e não limitar uma interpretação relevante nesta análise.

Validade de Constructo

Análise Fatorial Confirmatória. Neste estudo, realizou-se uma Análise Fatorial Confirmatória (AFC) como método confirmatório da estrutura unidimensional da escala OASB numa amostra de adolescentes. Esta metodologia, inserida no âmbito dos modelos de equações estruturais, serve essencialmente para confirmar padrões estruturais, ou seja, se os fatores latentes são responsáveis pelo comportamento de determinados indicadores (i.e., variáveis manifestas) de acordo com um modelo teórico (Maroco, 2010Maroco, J. (2010). Análise de equações estruturais: Fundamentos teóricos, software & aplicações [Analysis of structural equations: Theoretical foundations, software & applications]. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda.). Seguiu-se esta opção para testar o modelo, uma vez que em trabalhos anteriores os resultados indicavam a solução unidimensional da OAS (Matos et al., 2011Matos, M., Pinto-Gouveia, J., & Duarte, C. (2011). Other as Shamer: Versão portuguesa e propriedades psicométricas de uma medida de vergonha externa. Manuscript submitted for publication., 2015Matos, M., Pinto-Gouveia, J., Gilbert, P., Duarte, C., & Figueiredo, C. (2015). The Other As Shamer Scale-2: Development and validation of a short version of a measure of external shame. Personality and Individual Differences, 74, 6-11. doi:10.1016/j.paid.2014.09.037
https://doi.org/10.1016/j.paid.2014.09.0...
). O método de estimação do modelo utilizado foi o Método de Máxima Verosimilhança (ML; Maximum Likelihood).

Para analisar a qualidade global da AFC, observou-se o teste de qui-quadrado (χ2), que mede a discrepância entre o modelo e os dados (Byrne, 2010Byrne, B. M. (2010). Structural Equation Modelling with AMOS: Basic Concepts, Applications, and Programming (2nd ed.) New York: Routledge Academic.), cujo valor pretende-se que seja o menor possível. Contudo, este teste estatístico é muito sensível ao tamanho da amostra e aos desvios à normalidade e linearidade (Schermelleh-Engel, Moosbrugger, & Müller, 2003Schermelleh-Engel, K., Moosbrugger, H. & Müller, H. (2003). Evaluating the fit of structural equation models: Tests of significance and descriptive goodness-of-fit measures. Methods of Psychological Research Online, 8(2), 23-74.). Por esta razão foram utilizados, em simultâneo, outros indicadores. Assim, utilizaram-se os seguintes índices de qualidade de ajustamento: Goodness of Fit Index (GFI); Comparative Fit Index (CFI); Tucker-Lewis Index (TLI), Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA). Considerou-se que valores de GFI, CFI e TLI iguais ou superiores a 0,90 correspondem a um bom ajustamento dos dados, e valores de RMSEA inferiores a 0,05 são indicadores de um excelente ajustamento, iguais ou inferiores a 0,08 de um bom ajustamento e iguais ou inferiores a 0,10 de um ajustamento marginal (Byrne, 2010Byrne, B. M. (2010). Structural Equation Modelling with AMOS: Basic Concepts, Applications, and Programming (2nd ed.) New York: Routledge Academic.; Kline, 2005Kline, R. (2005). Principles and practice of structural equation modelling (2th ed.). New York: The Guilford Press.; Maroco, 2010Maroco, J. (2010). Análise de equações estruturais: Fundamentos teóricos, software & aplicações [Analysis of structural equations: Theoretical foundations, software & applications]. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda.).

A qualidade do ajustamento local foi avaliada pelos pesos fatoriais (λ ≥ 0,5) e pela fiabilidade individual dos itens (R2 ≥ 0,25) (Maroco, 2010Maroco, J. (2010). Análise de equações estruturais: Fundamentos teóricos, software & aplicações [Analysis of structural equations: Theoretical foundations, software & applications]. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda.). A Fiabilidade Compósita (FC) indica a consistência interna dos itens que refletem o fator, considerando-se valores de FC ≥ 0,7 indicadores de uma adequada fiabilidade de constructo (Maroco, 2010).

Os resultados da AFC com base nos índices de ajustamento mostram que o modelo unifatorial da OASB-A revelou uma qualidade de ajustamento global boa: GFI = 0,959, CFI = 0,973, TLI=0,962, RMSEA = 0,084, I.C. 90% [0,071, 0,098], p ≤ 0,001. Como se pode verificar, o qui-quadrado, χ2 (20) = 137,54, p < 0,001, e o valor do RMSEA são estatisticamente significativos. No entanto, estes valores podem ser influenciados pelo tamanho da amostra (Byrne, 2010Byrne, B. M. (2010). Structural Equation Modelling with AMOS: Basic Concepts, Applications, and Programming (2nd ed.) New York: Routledge Academic.; Kline, 2005Kline, R. (2005). Principles and practice of structural equation modelling (2th ed.). New York: The Guilford Press.). Porém, os outros índices de ajustamento apresentam valores indicadores de um bom ajustamento do modelo aos dados.

Quanto à qualidade de ajustamento local do modelo, verifica-se que todos os itens apresentam pesos fatoriais elevados, que variam entre 0,71 (item 8) e 0,87 (item 5), e fiabilidades individuais igualmente elevadas que vão desde 0,50 (item 8) até 0,76 (item 5; Figura 1). A fiabilidade compósita do modelo simplificado revelou-se elevada, sendo de .93 para o total da escala (8 itens). A Figura 1 apresenta o modelo final com os pesos fatoriais e as correlações múltiplas ao quadrado (R2).

Figura 1
Modelo unifatorial da OASB-A numa amostra de 834 adolescentes.

Análise multigrupos - rapazes versus meninas (N = 206). Uma vez que o gênero pode influenciar as propriedades psicométricas de medidas psicológicas, torna-se importante analisar se a estrutura fatorial subjacente ao instrumento medida, usado para avaliar constructos latentes, é invariante para os gêneros (Meredith, 1993Meredith, W. (1993). Measurement invariance, factor analysis and factorial invariance. Psychometrika, 58(4), 525-543. http://dx.doi.org/10.1007/BF02294825
http://dx.doi.org/10.1007/BF02294825...
). Uma medida é considerada invariante quando é estruturalmente equivalente, em termos das suas propriedades fatoriais, nos grupos de interesse (Maroco, 2010Maroco, J. (2010). Análise de equações estruturais: Fundamentos teóricos, software & aplicações [Analysis of structural equations: Theoretical foundations, software & applications]. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda.; Meredith, 1993Meredith, W. (1993). Measurement invariance, factor analysis and factorial invariance. Psychometrika, 58(4), 525-543. http://dx.doi.org/10.1007/BF02294825
http://dx.doi.org/10.1007/BF02294825...
).

Assim, este estudo pretende examinar a invariância da medida OASB-A relativamente ao sexo (rapaz versus meninas) por meio da análise multigrupos. Esta análise foi realizada numa amostra aleatória, a partir da amostra total, compreendendo 206 casos. Esta decisão de aleatorizar a amostra total foi tomada devido à sensibilidade do teste estatístico utilizado (qui-quadrado; Schermelleh-Engel, Moosbrugger & Müller, 2003Schermelleh-Engel, K., Moosbrugger, H. & Müller, H. (2003). Evaluating the fit of structural equation models: Tests of significance and descriptive goodness-of-fit measures. Methods of Psychological Research Online, 8(2), 23-74.) em relação ao tamanho da amostra. Além disso, seguimos as indicações de vários autores (Costello & Osborne, 2005Costello, A. B., & Osborne, J. W. (2005). Best practices in exploratory factor analysis: Four recommendations for getting the most from your analysis. Practical Assessment & Research Evaluation, 10, 1-9.) que defendem que para a realização de análises fatoriais se devem ter pelo menos 15 sujeitos por variável observada. A invariância do modelo de medida de vergonha externa em rapazes e meninas foi avaliada por comparação do modelo livre (com pesos fatoriais e variâncias/covariâncias dos fatores livres) com um modelo constrito onde foram fixados os pesos fatoriais e as variâncias/covariâncias dos dois grupos. A significância estatística da diferença dos dois modelos foi feita com o teste do Qui-quadrado. Estes procedimentos foram realizados com base nas recomendações de Maroco (2010)Maroco, J. (2010). Análise de equações estruturais: Fundamentos teóricos, software & aplicações [Analysis of structural equations: Theoretical foundations, software & applications]. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda..

De acordo com os índices de ajustamento, o modelo fatorial apresenta um ajustamento adequado, em simultâneo, a rapazes e meninas: GFI= 0,902, CFI = 0,957, TLI= 0,940, RMSEA = 0,074, I.C. 90% [0,052, 0,096], p = 0,037. Adicionalmente, os resultados demonstram a invariância do modelo de medida de vergonha externa para rapazes e moças (χ2dif(8) = 5,605, p = 0,691 < χ20,95;(8) = 15,507).

Fidelidade

Análise dos itens e consistência interna. O estudo da qualidade dos itens que constituem a escala foi feito por meio da correlação do item com os respetivos totais (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.; Tabachnick & Fidell, 2007Tabachnick, B. G., & Fidell, L. S. (2007). Using multivariate statistics (5th Edition.). Boston, MA: Allyn and Bacon.). A Tabela 1 indica para cada item da escala a média, o desvio-padrão e a correlação corrigida entre o item e total da escala, bem como o α de Cronbach se o item fosse excluído. Por último, é também apresentado o α de Cronbach para o total da Escala de Vergonha Externa para Adolescentes - versão breve (OASB-A).

Tabela 1
Propriedade dos itens da versão breve da Escala de Vergonha para adolescentes (OASB- A) (N = 834)

Ao analisar a qualidade dos itens da Escala de Vergonha Externa para adolescentes, verifica-se (cf. Tabela 1) que todos os itens apresentam correlações item-total iguais ou superiores a 0,65, o que indica que os itens contribuem consistentemente para a medida global de vergonha.

O coeficiente de alfa de Cronbach obtido para a escala total (α = 0,92) é indicador de uma excelente consistência interna (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.; Tabachnick & Fidell, 2007Tabachnick, B. G., & Fidell, L. S. (2007). Using multivariate statistics (5th Edition.). Boston, MA: Allyn and Bacon.). Adicionalmente, todos os itens contribuem para a consistência interna da escala da versão portuguesa para adolescentes, na medida em que a remoção de algum item não incrementaria a consistência interna.

Fidelidade teste-reteste. Para analisar a estabilidade temporal da OASB-A, foi necessário administrá-la em dois momentos diferentes, com um intervalo de três semanas, a um grupo de adolescentes (N = 56), obtendo-se o coeficiente de correlação de r de Pearson de 0,73, o que sugere uma boa estabilidade temporal do instrumento (Field, 2013Field, A. (2013). Discovering Statistics using IBM SPSS Statistics (4th edition). London: SAGE Publication Lda.). Comparadas as médias através do teste t-Student para amostras emparelhadas, verifica-se que não há diferenças estatisticamente significativas entre os valores médios obtidos nos dois intervalos de tempo, t(55) = 0,608, p =0,552.

Influência das Variáveis Sexo, Idade e Anos de Escolaridade

Para analisar o papel das variáveis sociodemográficas sobre a vergonha (total), foram determinados os coeficientes de correlação de Pearson (para a idade e anos de escolaridade). Realizou-se ainda correlação bisserial por pontos, no caso da variável sexo.

Os resultados indicam que a vergonha externa (total) não se mostrou correlacionada com a idade (r = -0,03, p > 0,05), nem com os anos de escolaridade (r = -0,03, p > 0,05). Em relação ao sexo, verificaram-se diferenças significativas, t(832) = 2,396, p = 0,017 com as meninas, que apresentarem médias mais elevadas de sentimentos de vergonha externa (M = 10,50, DP = 7,07), comparativamente aos rapazes (M = 9,36, DP = 6,62).

Validade Convergente (N = 367)

A validade convergente da OASB-A na amostra de 367 adolescentes foi analisada por meio da determinação dos coeficientes de correlação de Pearson entre o total da referida escala e os totais da IES-A e da DASS-21. Como se pode verificar na Tabela 2, as correlações entre a vergonha externa e o impacto traumático, bem como o total da sintomatologia depressiva, ansiosa e de estresse, foram moderadas, revelando-se estatisticamente significativas. Estas associações, na direção esperada, sustentam a conclusão de que os constructos avaliados por estes instrumentos, embora distintos, se encontram relacionados.

Tabela 2
Validade convergente (N = 367)

Discussão e Conclusões

Dada a importância dos sentimentos de vergonha na fase desenvolvimental da adolescência, torna-se relevante o estudo de medidas fidedignas para a sua avaliação e compreensão, que permitam a sua utilização em vários contextos de intervenção com adolescentes (e.g., educacional, clínico). O objetivo central deste estudo recaiu sobre a análise das propriedades psicométricas da Escala de Vergonha Externa - versão breve (OASB-A) - para a população Portuguesa de adolescentes e a apresentação dos resultados de dimensionalidade, fidedignidade e validade.

A Análise Fatorial Confirmatória efetuada replicou a estrutura unidimensional encontrada em estudos anteriores (Matos et al., 2011Matos, M., Pinto-Gouveia, J., & Duarte, C. (2011). Other as Shamer: Versão portuguesa e propriedades psicométricas de uma medida de vergonha externa. Manuscript submitted for publication., 2015Matos, M., & Pinto-Gouveia, J. (2010). Shame as a traumatic memory. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(4), 299-312. doi: 10.1002/cpp.659
https://doi.org/10.1002/cpp.659...
). De modo geral, o modelo da OASB-A apresentou um bom ajustamento aos dados e uma excelente fiabilidade individual dos itens e compósita.

Relativamente à análise de gênero, os resultados mostram que as meninas reportam, comparativamente aos rapazes, uma maior crença que os outros as veem com atributos negativos ou desvalorizadores (e.g., inferior, defeituosa e incompetente). Existem alguns estudos empíricos que não encontram diferenças de gênero nos sentimentos de vergonha (e.g., Cunha et al., 2012Cunha, M., Matos, M., Faria, D., & Zagalo, S. (2012). Shame Memories and Psychopathology in Adolescence: The Mediator Effect of Shame. International Journal of Psychology & Psychological Therapy, 12(2), 203-218.; De Rubeis & Hollenstein, 2009De Rubeis, S. & Hollenstein, T. (2009). Individual differences in shame and depressive symptoms during early adolescence. Personality and Individual Differences, 46, 477-482. doi:10.1016/j.paid.2008.11.019
https://doi.org/10.1016/j.paid.2008.11.0...
; Matos et al., 2015Matos, M., Pinto-Gouveia, J., Gilbert, P., Duarte, C., & Figueiredo, C. (2015). The Other As Shamer Scale-2: Development and validation of a short version of a measure of external shame. Personality and Individual Differences, 74, 6-11. doi:10.1016/j.paid.2014.09.037
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). Contudo, diversos autores defendem que, neste período da adolescência, as moças tornam-se particularmente vulneráveis a experiências de vergonha (De Rubeis & Hollenstein, 2009De Rubeis, S. & Hollenstein, T. (2009). Individual differences in shame and depressive symptoms during early adolescence. Personality and Individual Differences, 46, 477-482. doi:10.1016/j.paid.2008.11.019
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; Wolfe & Mash, 2006). Não obstante, verifica-se que a estrutura da OASB-A é equivalente para ambos os sexos.

Adicionalmente, os nossos resultados indicam que a nota total da vergonha não se correlaciona com a idade, nem com os anos de escolaridade. Este último dado parece estar de acordo com outras investigações já indicadas (De Rubeis & Hollenstein, 2009De Rubeis, S. & Hollenstein, T. (2009). Individual differences in shame and depressive symptoms during early adolescence. Personality and Individual Differences, 46, 477-482. doi:10.1016/j.paid.2008.11.019
https://doi.org/10.1016/j.paid.2008.11.0...
; Tangney et al., 1991Tangney J. P., Wagner, P. E., Gavlas, J., & Gramzow, R. (1991). The Test of Self-Conscious Affect for Adolescents (TOSCA-A). Fairfax, VA: George Mason University.; Tangney & Dearing, 2002Tangney, J. P., & Dearing, R. L. (2002). Shame and guilt. New York: The Guilford Press.), e que sugerem uma alteração da experiência de vergonha na transição para a idade adulta e não ao longo da adolescência.

Relativamente aos dados de fidelidade da OASB-A, os resultados indicaram que todos os itens contribuíram consistentemente para a nota global de vergonha, acrescendo que a remoção de algum item não aumentava a consistência interna, a qual foi excelente. A OASB-A demonstrou ainda características de boa estabilidade temporal na avaliação do constructo vergonha.

Como esperado, as correlações da OASB-A com outras medidas gerais de psicopatologia ou sofrimento psicológico foram moderadas e significativas. Assim, valores mais altos de vergonha externa parecem estar associados aos valores mais altos de sintomas de estresse traumático, depressão, ansiedade e estresse, o que também está de acordo com resultados de estudos anteriores (Cheung et al., 2004Cheung, M., Gilbert, P., & Irons, C. (2004). An exploration of shame, social rank and rumination in relation to depression. Personality and Individual Differences, 36(5), 1143-1153. http://dx.doi.org/10.1016/S0191-8869(03)00206-X
http://dx.doi.org/10.1016/S0191-8869(03)...
; Matos & Pinto-Gouveia, 2010Matos, M., & Pinto-Gouveia, J. (2010). Shame as a traumatic memory. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(4), 299-312. doi: 10.1002/cpp.659
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; Tangney & Dearing, 2002Tangney, J. P., & Dearing, R. L. (2002). Shame and guilt. New York: The Guilford Press.; Troop et al., 2008Troop, N. A., Allan, S., Serpell, L., & Treasure, J. L. (2008). Shame in women with a history of eating disorders. European Eating Disorders Review, 16, 480-488. DOI: 10.1002/erv.858
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) e com a associação da vergonha aos estados emocionais negativos (Gilbert, 1998Gilbert, P. (1998). What is shame? Some core issues and controversies. In P. Gilbert & B. Andrews (Eds.), Shame: Interpersonal behaviour, psychopathology and culture (pp. 3-36). New York: Oxford University Press., 2002Gilbert, P. (2002). Body shame: A biopsychosocial conceptualisation and overview, with treatment implications. In P. Gilbert & J. Miles (Eds.), Body Shame: Conceptualisation, research and treatment (pp. 3-54). London: Routledge.; Tangney et al., 1996Tangney, J. P., Miller, R. S., Flicker, L., & Barlow, D. (1996). Are shame, guilt, and embarrassment distinct emotions? Journal of Personality and Social Psychology, 70, 1256-1269. doi:10.1037/0022-3514.70.6.1256
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; Tangney et al., 2007Tangney, J., Stuewig, J., & Mashek, D. (2007). Moral emotions and moral behaviour. Annual Review of Psychology, 58, 345-372. doi:10.1146/annurev.psych.56.091103.070145.
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). De um modo geral, estes dados indicam que os adolescentes, cujas experiências precoces de vergonha têm características traumáticas (sintomas de intrusão, hiperativação, evitamento), tendem a acreditar que os outros os veem e julgam como sendo inferiores ou inadequados, experienciando níveis mais elevados de sintomas de ansiedade, depressão e estresse.

Este estudo apresenta algumas limitações. Apesar de considerarmos importante avaliar os sentimentos de vergonha em amostras da comunidade, também reconhecemos a relevância de ampliar a avaliação da mesma a outro tipo de amostras. Assim, como estudos futuros, sugere-se a replicação desta investigação em amostras clínicas e a consequente análise da validade discriminante e da validade divergente. Sob o ponto de vista desenvolvimental seria pertinente avaliar o impacto da idade numa amostra mais diferenciada em termos de faixas etárias. Uma outra limitação inerente a este estudo refere-se ao o uso exclusivo de questionários de autorrelato. Como esta emoção complexa reside no contributo de outros fatores individuais, biológicos e socioculturais, seria importante complementar a análise da validade convergente através de outras medidas complementares (e.g., entrevistas, multi-informadores).

Não obstante as referidas recomendações, os dados obtidos neste estudo permitem concluir que a versão breve da OAS é fiável e válida para ser utilizada em amostras da comunidade de adolescentes de língua Portuguesa. Além disso, a avaliação e compreensão acerca da natureza dos sentimentos de vergonha podem ser úteis no desenvolvimento de programas de prevenção e intervenção nas dificuldades psicológicas com esta faixa etária. Assim, a OASB-A para a população Portuguesa de adolescentes permite avaliar a emoção de vergonha nesta faixa etária e é um instrumento de utilização rápida e útil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    16 Jun 2014
  • Aceito
    26 Jun 2016
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